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Dissidente soviético Eduard Limonov inspira livro de escritor francês
0Rachel Donadio, na Folha de S.Paulo
Emmanuel Carrère, um dos mais conhecidos escritores franceses, encontrou um personagem perfeito em Eduard Limonov, que se descreve como o Johnny Rotten dos escritores soviéticos dissidentes. O resultado é o livro “Limonov” (Ed. Alfaguara), com o subtítulo “as ultrajantes aventuras do poeta soviético radical que se tornou um vagabundo em Nova York, uma sensação na França e um anti-herói político na Rússia”.
Carrère direciona sua mescla de ficção com reportagem biográfica e o seu interesse por grandes questões para esse poeta russo cuja classificação é impossível: ao mesmo tempo um rebelde e um totalitário, um escritor obsceno de memórias semificcionais que, após anos no Ocidente, ficou ao lado dos sérvios na guerra da Bósnia e depois retornou à Rússia para se tornar um agitador político ultranacionalista.
Carrère, cuja família materna é russa, disse que viu em Limonov algo emblemático sobre o mundo pós-soviético. Os dois se conheceram em Paris no começo dos anos 1980, e Carrère retomou o contato em 2008. Passou duas semanas em Moscou com Limonov, que tentava, sem sucesso, levar ao Parlamento o seu Partido Bolchevique Nacional, composto por um espectro de pessoas que vão de skinheads ultranacionalistas a desajustados da contracultura.
“Depois de duas semanas, não sabia o que eu achava dele -se eu gostava dele ou não e se o achava um mocinho ou um vilão”, disse Carrère, 56.
O livro começa com uma citação do presidente russo, Vladimir Putin: “Quem quer a União Soviética de volta não tem cérebro. Quem não sente saudades dela não tem coração”. Essa complexa nostalgia é o tema central de “Limonov”, assim como a interação entre o radicalismo e o revanchismo; a atração pelo fascismo, mesmo dentro da classe criativa; e a ingenuidade da “intelligentsia” ocidental ao pensar que a história, ou pelo menos o nacionalismo, acabaria depois da Guerra Fria.
A obra se baseia em grande parte nas memórias semificcionais de Limonov. Afinal, como Carrère conseguiria saber o que passou pela cabeça do autor russo quando este fazia amor com uma de suas problemáticas mulheres ou muitas namoradas? Ou que ele teve uma experiência semelhante a atingir o nirvana quando esteve na prisão? “Não fiz checagem nenhuma”, disse Carrère. “Se estiver errado, não me importo.”
Limonov, que hoje tem 71 anos e leva uma vida modesta em Moscou, chama-se na verdade Eduard Savenko. Mudou de nome como “homenagem ao seu humor ácido e combativo, porque ‘limon’ significa limão, e ‘limonka’ é uma gíria para um tipo de granada de mão”, escreve Carrère. Depois de fazer trabalhos subalternos e cometer pequenos crimes, Limonov começou a escrever poesia. Em 1974, fugiu de Moscou para Nova York.
Ao contrário de Joseph Brodsky e Yevgeny Yevtushenko, poetas dissidentes a quem ele inveja e despreza, Limonov teve uma vida marcada pelas drogas, pela violência e pelo sexo.
Quando Limonov chegou à França, em 1980, estava desfrutando do sucesso de “It’s Me, Eddie”, livro de memórias fictícias sobre sua vida em Nova York.
“O que ele tem na cabeça é medonho”, escreve Carrère, “mas você precisa admirar a honestidade com a qual ele descarrega isso: ressentimento, inveja, ódio de classe, fantasias sádicas, mas sem hipocrisia, sem constrangimento e sem desculpas”.
8 fatos estranhos da vida dos escritores
0Como todos os seres humanos, os escritores possuem diversificados hábitos e manias, fato esse que se acentua em determinadas situações.
Dayane Manfere, no Homo Literatus
Muitos podem considerar certas manias como loucura, outros não se importam, mas o que impera é a dúvida: o hábito ajudou os escritores ou a escrita influenciou seus hábitos?
Para ilustrar a questão vamos iniciar com Fernando Pessoa, poeta português que viveu alguns anos de sua vida na África do Sul. Era um grande apreciador de horóscopos, e quando Cecilia Meireles marcou um encontro com o poeta enquanto esteve em Portugal, levou um chá de cadeira: passou horas aguardando-o e, decepcionada pela ausência, foi embora. Chegando a seu hotel, recebeu um livro com uma explicação: seu horóscopo informou que aquela manhã não era um bom dia para encontros.
Victor Hugo por sua vez, só escrevia em pé. Por vezes passava quatorze horas seguidas trabalhando e foi justamente assim que produziu sua obra Os Miseráveis.
Já o inglês Lord Byron, um dos maiores poetas europeus e personalidade que mais influenciou no romantismo, tinha gansos como animais de estimação. Eles o acompanham, inclusive, a ida em eventos sociais. Byron tinha também outros fatos e rituais que marcaram sua vida, além de dúvidas até hoje impostas, como o fato de que tinha uma perna torta, mas ninguém sabia qual era e quem dizia saber nunca entrava em um consenso.
Honoré de Balzac amava café. Ingeria cerca de 50 xícaras por dia, e quando não conseguia tomar, ele mesmo moía os grãos e o comia puro.
Já Edgar Allan Poe, enquanto esteve em um internato na Inglaterra, que ficava ao lado de um cemitério, teve aulas de matemática ao lado dos túmulos onde ele e os demais alunos calculavam a idade dos mortos pela data marcada nas lápides. Para os exercícios físicos os alunos abriam as covas onde os mortos da cidade seriam enterrados.
Entre as irmãs Brontë, Emily era a mais excêntrica. A romancista passava horas parada, olhando para a janela, ficava silenciosa contemplando o mundo. Certa vez sua irmã Charlotte a apanhou olhando para a janela e descobriu, horas depois, que as venezianas estavam fechadas, Emily ficou seis horas parada observando as venezianas da janela.
Já Franz Kafka tinha um complexo enorme sobre seu corpo. Foi adepto de diversas dietas e inclusive por questões de saúde era vegetariano. Na época em que viveu, o nudismo estava em voga e assim como seus demais contemporâneos Kafka frequentava SPA, mas diferente dos demais se recusou a retirar as calças e ficou conhecido como “o homem com calção de banho”.
Pablo Neruda só escrevia com tinta verde. Inclusive certa vez escrevia um poema quanto à tinta se tornou escassa. Quando o estoque voltou ao normal já era tarde, perdeu a inspiração e seu poema ficou inacabado.
Até quanto os hábitos desses e tantos escritores os influenciaram a se tornarem o que são hoje? E você, tem algum hábito que o influencia ou alguma influência que derivou novos hábitos?
Fontes
1 – A vida secreta dos grandes autores. Robert Schnakenberg. Ediouro
2 – Manias e métodos de trabalho de 10 grandes escritores. Revista Bula, por Euler de França Belém (clique aqui)
3 – Costumes e manias dos escritores famosos. Folha de S. Paulo (clique aqui)
4 – As manias mais curiosas dos escritores. Saraiva Conteúdo, por André Bernardo. (clique aqui)
5 – A mania dos escritores. Falando de Literatura, por Fernanda Jimenez. (clique aqui)
Mostra exibe anotações em livros da biblioteca de Waly Salomão
0Exposição com o acervo inédito do poeta abre ao público hoje na Biblioteca Parque Estadual

Um dos livros grifados por Waly: “O grifo muda o nosso olhar em relação ao livro. A gente ouve a voz dele nas marcações”, diz Omar Salomão, filho de Waly e curador da mostra – Reprodução
Mariana Filgueiras em O Globo
RIO — A ideia surgiu por acaso, numa conversa da editora Anna Dantes com o músico Marcelo Yuka. Ele viu o livro “Signos”, de Merleau-Ponty sobre a mesa do escritório dela, tomou-o para folhear, e Anna comentou que o exemplar havia sido do poeta Waly Salomão. Estava ali porque ela começaria em breve a pensar em uma exposição sobre Waly, mas que ainda não tinha um mote definido. Na última página do livro, Yuka notou uma ameaça de poema entre rabiscos, frases sublinhadas, palavras circuladas. Anna comentou que todos os livros de Waly eram assim, repletos de grifos. O músico sugeriu: “Você podia fazer uma exposição só com os grifos dele: ‘A biblioteca de grifos de Waly Salomão’”.
— Pronto. Ali nasceu a exposição. A ideia estava na minha mesa, e eu ainda não tinha percebido — comenta Anna, ao lado do poeta Omar Salomão, filho de Waly, que assina com ela a curadoria da mostra que começa hoje para o público na Biblioteca Parque Estadual e segue até o dia 14 de dezembro, com exemplares do acervo pessoal do poeta morto em 2003. — Quando a gente se depara com as anotações que ele fazia, a maneira como ele lia, entende muito da mente dele. Os grifos eram um recado para ele mesmo como leitor futuro, como uma mensagem na garrafa. E agora as mensagens estarão ao alcance de todos os leitores.
Ato de libertação
Waly lia compulsivamente. Comia os livros, com aquela bocarra cheia de dentes e sorrisos, dobrando suas páginas, marcando palavras com o que tivesse à mão, fossem canetinhas, marca-textos ou as próprias unhas (Omar conta rindo das vezes em que viu o pai fazer isso). Fazia desenhos envolvendo as frases, emoldurava palavras unas, e às vezes, ao ler o mesmo livro em línguas diferentes, fazia anotações completamente distintas. Tinha cerca de 8 mil volumes nas estantes de casa — e a maioria carrega o percurso da sua leitura, como poderá ser visto pelo público na exibição.
— O grifo muda o nosso olhar em relação ao livro. Os que ele fazia não eram grifos de estudo, as marcas não indicam uma leitura de estorvo, mas de libertação. A gente ouve a voz dele nas marcações, seja em volumes de Roland Barthes, Murilo Mendes ou nos livros de zen-budismo — observa Omar, lembrando que muitas dessas anotações ecoam em seus poemas e letras de músicas.
É possível ver mesmo: no livro “Lírica, Épica, Teatro e Cartas de Camões”, por exemplo, Waly emoldura a frase “Oh! bem-aventurados fingimentos”, assinando embaixo, como se o verso também pudesse ser dele; no livro “Malone morre”, de Samuel Beckett, ao lado da frase “Nasci sério, como tem gente que já nasce sifilítico”, escreve: “parece Nelson Rodrigues!”. Completa poemas de Drummond, como se fossem textos abertos; e numa dedicatória de um livro a Oswald de Andrade, desenha ali uma espécie de labirinto cerebral antropofágico sobre o nome do autor. Ah, sim, o poema notado por Yuka também esta lá: “Uma arte poética/ manter tenso o arco que /Abrange caos e cosmos/ Uma área poética/ Limpar a área do terreno/ Desprogramar bulas e receitas/Posologias e fórmulas prévias/ Ou ainda: “Uma arte poética/ Penetrar até o centro do coração de cada código e desprogramar/ Bulas, receitas e posologias e/ Fórmulas prévias/ Pescar em águas límpidas/ Pescar em águas turvas/ Usar em mão dupla/ O arco que une caos e cosmos”.
Painéis pela cidade
A mostra conta ainda com vídeos, depoimentos do autor e uma instalação interativa, onde o público poderá deixar sua própria intervenção em textos de Waly. O escritor Leonardo Villa-Forte vai colaborar com três instalações do “Paginário”, projeto de sua autoria que enche de grifos literários alguns muros da cidade. Serão três painéis: um na biblioteca, um na Rua da Alfândega e um na estação de metrô da Central. Já a filósofa Rosa Dias vai participar ministrando semanalmente jogos de leituras com convidados.