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Cresce número de jovens que nem estudam nem trabalham no Brasil
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Jovens: 14,4% não estão sequer procurando trabalho ou ocupação, segundo o IBGE (Thinkstock)
A proporção dos jovens “nem nem”, que não estudam nem trabalham, aumentou em 2015 em relação a 2014
Publicado na Exame
Rio â O número de jovens de 15 a 29 anos que não estudavam nem trabalhavam em 2015 cresceu no PaÃs, chegando a 22,5% da população dessa faixa etária. Sequer procuravam trabalho 14,4% dessas pessoas.
A proporção dos chamados ânem nemâ cresceu 2,5 pontos percentuais em relação a 2014 (20%) e 2,8 frente a 2005 (19,7%). O grupo de 18 a 24 anos apresentou o maior porcentual em 2015: 27,4%.
Os dados são da SÃntese de Indicadores Sociais, que o Instituto Brasileiro de Geografia e EstatÃstica (IBGE) divulga nesta sexta-feira, 2.
âà quase um quarto dos jovens, e os números mostram que o porcentual dos `nem nem nemâ, que não estudam, não trabalham e não procuram trabalho, não varia mesmo em cenários diferentesâ, aponta a analista do IBGE Luanda Botelho, referindo-se ao fato de que os ânem nem nemâ terem representado 12,8% dos jovens em 2005.
âNo caso dos `nem nemâ, a piora do mercado de trabalho influenciou o resultado. Quando a economia piora, os jovens são os mais afetados e os que mais demoram a se recuperar.â
Por conta da maternidade e da maior dedicação a afazeres domésticos, o porcentual de mulheres não estudantes e inativas em 2015 era quase o dobro do que o de homens: 29,8%, contra 15,4%.
Em 2005, estas proporções eram 28,1% e 11,1%.Da população feminina de todas as faixas que não trabalhavam nem estudavam, 91,6% ocupava-se das tarefas da casa, incluindo aà os cuidados com os filhos.
Quando se comparam homens e mulheres que trabalham fora, a persistência da sobrecarga sobre elas quanto às atividades domésticas é evidenciada pelos dados do IBGE.
De 2005 a 2015, o número de horas semanais que os homens gastaram com esse tipo de atividade não se alterou: ficou em 10 horas.
Já entre as mulheres o dispêndio de tempo é o dobro disso, e, somada à jornada de trabalho fora, a jornada total semanal feminina é em média cinco horas maior do que a masculina.
A SÃntese é feita pelo IBGE desde 1998. Esta edição utilizou números da Pesquisa Nacional por Amostra de DomicÃlios 2015 e do Censo de 2010, entre outras publicações, e trouxe dados relativos a demografia, famÃlias, educação, trabalho, distribuição de renda e domicÃlios. O objetivo da sÃntese é traçar um perfil das condições de vida da população.
Livros de youtubers viraram a grande aposta do mercado editorial
0Eles são as principais atrações da Bienal do Livro de São Paulo
Nina Finco, na Ãpoca
Era a noite do último dia 7 de julho, uma quinta-feira. Na Livraria Cultura da Avenida Paulista, uma das maiores de São Paulo, uma fila enorme se formava no interior da loja, se estendia para uma rua nas imediações e dobrava o quarteirão do centro comercial onde ela está localizada. Jovens e adultos se amontoavam para conseguir um autógrafo do autor de um novo livro. Das 19 horas até a 1 hora, 800 pessoas obtiveram seus exemplares autografados, mas alguns azarados ficaram do lado de fora. O escritor não era nenhum expoente da literatura nacional, muito menos ganhador de algum prêmio das letras. Na verdade, um dos galardões que ostenta é o Shorty Awards, o Oscar da internet.
Por trás da mesa de autógrafos estava Paulo Cezar Siqueira, o PC Siqueira, de 30 anos, um dos youtubers mais influentes do Brasil, com mais de 2 milhões de inscritos em seu canal. A seu lado estava o jornalista Alexandre Matias, que escreveu o livro PC Siqueira está morto (Suma de Letras, 248 páginas, R$ 29,90). O livro reúne narrativas nas quais PC é o personagem principal, mas é uma ficção que não deixa claro onde acaba a realidade e começa a imaginação. âEu não queria que fosse mais um livro de youtuber, sobre carreira ou sobre minha vidaâ, diz PC.

QUERIDINHA A influenciadora Maju Trindade. A forte presença nas redes sociais conquistou uma legião de fãs (Foto: Stefano Martini/ÃPOCA)
Apesar de ser um dos primeiros youtubers do paÃs, PC está longe de ser pioneiro nessa movimentação rumo ao mundo literário. Desde o ano passado, livros de autoria de youtubers vêm tomando as prateleiras das livrarias a passos firmes. Segundo a Nielsen BookScan, empresa que monitora o mercado editorial, cerca de 33 youtubers lançaram tÃtulos nos últimos 12 meses. Eles seguem a trilha aberta pela youtuber Kéfera Buchmann, do canal 5inco minutos. Seu livro Muito mais do que 5inco minutos (Paralela, 144 páginas, R$ 24,90) vendeu mais de 400 mil exemplares em 2015, o que colocou Kéfera em 6o lugar na lista dos dez autores brasileiros com mais vendas de livros no ano passado.Em média, um lançamento de um autor brasileiro contemporâneo fica em torno de 3 mil exemplares por edição.
Em 2016, no encalço de Kéfera, vieram Julia Tolezano, do canal Jout Jout Prazer, cujo livro Tá todo mundo mal (Cia. das Letras, 200 páginas, R$ 29,90) vendeu 35 mil cópias desde maio, e Karol Pinheiro, cuja biografia As coisas mais legais do mundo figura entre os 20 mais vendidos da lista de não ficção de 2016 da Nielsen. A mais recente integrante do clube das youtubers literárias é a transexual Amanda Guimarães, do canal Mandy Candy, que acaba de lançar a biografia Meu nome é Amanda (Fábrica 231, 136 páginas, R$ 19,50).
O YouTube surgiu como uma plataforma para vÃdeos amadores em 2005. O mote original era âtransmita-seâ. Com o tempo, o site tornou-se o palco para todo tipo de criador de conteúdo. A gama de produtos vai de videoblogs a webséries, passando por vÃdeos de âfaça você mesmoâ. Munidos de uma câmera e um programa de edição, eles contam causos da vida, comentam acontecimentos do mundo da polÃtica e da cultura, fazem piadas de si próprios, criam tutoriais de maquiagem e ensinam receitas culinárias. Tudo ao alcance de um clique.

QUIMERA
PC Siqueira em seu apartamento, em São Paulo. Seu livro mistura realidade e ficção (Foto: Anna Carolina Negri)
Os youtubers evoluÃram junto com a plataforma. Alguns canais têm audiências de fazer inveja a programas de televisão e muitos youtubers criaram suas próprias marcas. Passaram a usá-
las como trampolim para turnês, carreiras musicais, aparições em filmes e no teatro. PC, Kéfera Buchmann, Christian Figueiredo e Jout Jout, que também têm contas no Instagram, no Twitter, no Snapchat, no Facebook e em qualquer nova rede social que surgir, tornaram-se estrelas com milhões de seguidores ávidos por consumir qualquer conteúdo produzido por eles. Os fãs pagam para participar de encontros com as webcelebridades na esperança de conseguir um autógrafo ou um selfie.
Não tardou para que as editoras brasileiras passassem a ver nos youtubers uma oportunidade para alavancar os negócios de um mercado com queda nas vendas e alta nos custos de produção. Como grande parte dos livros comercializados é internacional, o dólar mais caro fez com que os preços de aquisição de tÃtulos quadruplicassem. Era preciso focar em algo local e mais barato. Para as editoras, os youtubers se tornaram uma fonte de autores nacionais acessÃveis e conhecidos do público. Acabaram virando uma âncora do mercado, depois do fim da febre dos livros para colorir.

NO CONTROLE
O gamer Pedro Afonso Rezende Posso. Além de divertir os jovens com seus vÃdeos, ele quer incentivar a leitura (Foto: Stefano Martini/ÃPOCA)
âO youtuber é produtor e vendedor do próprio conteúdo e traz consigo um consumidor vorazâ, afirma Ismael Sousa, gestor da Nielsen BookScan Brasil. âA matemática é simples: mais conteúdo, plataformas e mÃdia equivalem a mais fãs e mais receitaâ, afirma David Craig, especialista em transmÃdia e professor de comunicação da Universidade do Sul da Califórnia. âEsses livros apelam para os superfãs, que querem um livro fÃsico em suas mãos como prova de que são membros vitais da comunidade do youtuber.â
Por causa desse senso de comunidade existente entre os youtubers e os fãs, as biografias figuram entre os subgêneros mais explorados pelas editoras. No domingo do Dia dos Pais, 14 de agosto, 200 adolescentes se reuniram na praça de alimentação do Botafogo Praia Shopping, no Rio de Janeiro, para a sessão de autógrafos do livro Maju (Paralela, 168 páginas, R$ 29,90), de Maju Trindade. A youtuber fez 18 anos em junho, mas já lançou sua biografia, escrita em parceria com a escritora e ex-VJ da MTV Jana Rosa. Ainda pré-adolescente, Maju publicava vÃdeos no YouTube nos quais falava sobre o dia a dia na escola e suas crises â ela filmava tudo escondido com a câmera da avó.
Do YouTube, Maju migrou para outras redes sociais como (mais…)
Editoras apostam em biografias e diários de jovens celebridades para atrair novos leitores
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‘O diário de Larissa Manoela’ se transformou em um verdadeiro best-seller (foto: Reprodução/Instagram)
Livros que contam a trajetória de artistas como Larissa Manoela, Kéfera Buchmann e Luan Santana estão entre os mais vendidos do paÃs
Ana Clara Brant, no UAI
O cantor sertanejo Luan Santana tem 25 anos. A vlogueira e apresentadora Kéfera Buchmann tem 23. O astro teen norte-americano Justin Bieber completou 22 anos. Já a atriz e cantora Larissa Manoela, revelação do SBT/Alterosa, tem apenas 15 aninhos.
Mesmo com pouca idade, esses artistas já lançaram biografias ou diários em que relatam suas trajetórias de vida. E o mais curioso é que essas obras se tornaram verdadeiros best-sellers.
O diário de Larissa Manoela, por exemplo, publicado há menos de um mês e que apresenta a história da atriz, as dificuldades pelas quais passou até chegar ao estrelato e seu cotidiano de celebridade, já é um dos livros mais vendidos do paÃs. Até o fim da semana passada, ele tinha alcançado o número de 46.685 exemplares.
Luan Santana â A biografia, do jornalista Ricardo Marques, chegou ao mercado há pouco menos de um ano e já soma 40 mil livros vendidos.
Muito mais que 5incominutos, sobre a sensação da internet Kéfera, foi a publicação mais vendida da Bienal do Rio de 2015, com cerca de 400 mil exemplares, e chegou a ganhar elogios de Paulo Coelho e Gregório Duvivier.
âHá hoje, como nunca antes no Brasil, um público jovem leitor e consumidor. à natural que o mercado editorial tente a atender a esse gosto. E isso é um fenômeno não só daqui, mas de vários paÃses. Livros sobre artistas jovens fazem sucesso no mundo todo. A novidade brasileira é que hoje temos um público para esses lançamentos. Isso, sim, um fenômeno: a garotada, entre 14 e 17 anos, que tem na leitura o principal entretenimento. à mercado novo que se abre. E é também uma chance para que tenhamos, nos próximos anos, um novo público leitor adultoâ, comenta Carlos Andreazza, editor executivo de não ficção e ficção nacional da Editora Record, responsável pela biografia de Luan Santana.
Editora da Gutenberg, Silvia Tocci Masini também defende essa tendência e acredita que essas obras aproximam o artista do público.
âAinda que todas as informações estejam nas redes sociais, você tem bastante informação em um lugar só. O livro meio que eterniza o autor. Ele deixa a sua marca, sua história registrada. As redes sociais permitiram a aproximação dos fãs como âamigosâ desses popstars e um movimento de aquisição de qualquer produto ou informação que seja da personalidade em questão. Quando existe o livro, você reúne em um só lugar essas informações e até mesmo de maneira mais aprofundada, eternizando essa personalidadeâ, opina.
A grande maioria dos leitores dessas publicações é formada por fãs das celebridades, mas isso não impede que outras pessoas possam se interessar ou mesmo estimular a leitura entre essas pessoas. à o que defende Carlos Andreazza.
âà um público composto basicamente de fãs. Mas daà pode surgir interesse em outros livros, daà pode surgir um leitor. Temos de apostar nisso, no óbvio: leitor só se forma com leitura. Se há um jovem lendo, não importa o que, há esperança. Todo mundo tem biografia, eu, você. A questão é saber se essa biografia interessa a alguémâ, defende.
Boa parte das jovens celebridades que tem publicado livros é formada pelos youtubers. Muitos deles vão âinvadirâ a 24ª Bienal Internacional do Livro de São Paulo, que ocorre no fim de agosto, para participar de lançamentos, sessões de autógrafos e debates.
A própria Kéfera Buchmann se prepara para lançar no evento sua segunda obra, Tá gravando. E agora?, novamente pela Editora Paralela, do Grupo Companhia das Letras. Nele, a estrela da web conta como surgiu seu canal 5incominutos, atualmente com mais de 8 milhões de assinantes, e revela detalhes até então inéditos.
Outros astros da internet â Lucas Rangel, Jout Jout e PC Siqueira â, também vão marcar presença na grande feira. Fenômeno de público, o mineiro Marco Túlio Matos Vieira, de 20 anos, é criador do AuthenticGames, canal no YouTube com 6 milhões de seguidores, em que ele mostra seus gameplays de Minecraft, jogo eletrônico que permite a construção usando blocos (cubos) dos quais o mundo é feito.
Em março, Marco fez sua estreia nas letras e lançou Authentic Games â Vivendo uma vida autêntica, em que os leitores ficam sabendo como surgiu o projeto do canal, quem são os amigos da internet que o Authentic levou para a vida real e um pouco da sua trajetória.
O youtuber também estará na bienal paulista lançando seu segundo livro, Authentic games â A batalha da torre, que dará inÃcio a uma trilogia. O segundo sairá em novembro, e o terceiro em fevereiro do ano que vem.

Entre os youtubers brasileiros, o primeiro a se aventurar na literatura foi o carioca Felipe Neto (foto: Reprodução/Facebook)
Mudança no consumo
Entre os youtubers, o primeiro a se aventurar na literatura foi o carioca Felipe Neto, de 28 anos, com o livro Não faz sentido â Por trás das câmeras, que chegou à s livrarias em 2013.
A publicação conta a história do garoto que saiu do anonimato até sua exposição meteórica, os bastidores envolvendo seus vÃdeos, os desentendimentos com as celebridades, o processo de criação do Não faz sentido, considerado o primeiro canal em lÃngua portuguesa a atingir a marca de 1 milhão de assinantes.
Felipe faz questão de deixar claro que seu livro não se trata de uma biografia, apesar de dar detalhes de sua vida e de seu dia a dia.
âMeu canal tinha explodido e desde 2011 eu passei a escrever como o cenário do entretenimento tinha mudado, de que maneira as pessoas estavam consumindo o YouTube. Sempre quis mostrar essa história e não necessariamente a minha história. Ela só serviu de pano de fundo porque mostro a origem do meu personagem, do próprio canalâ, explica ele, que também descreve como a internet vai moldar uma nova geração.
Felipe Neto é apaixonado por literatura e conta que começou a escrever aos 8 anos. Criava historinhas de ficção que foram se tornando um verdadeiro vÃcio.
âPor isso, acho muito sério essa banalização do livro. A pessoa pega o que publica ou fala na internet e adapta para um livro. O que mais se vê hoje são jovens de 15, 16 anos publicando diários, biografias, sendo que nem conteúdo para isso eles têmâ, alfineta.
O vlogueiro ainda lamenta que essas iniciativas partam das própria editoras, que oferecem rios de dinheiro para que as webcelebridades possam escrever suas trajetórias.
âEu mesmo já passei por isso e não aceitei. Tem livro sendo escrito da noite para o dia, literalmente. E, muitas vezes, como alguns youtubers não sabem escrever direito, a editora contrata um ghost writer (escritor fantasma) para escrever no lugar deles. à uma vergonha e, sinceramente, acho muito tristeâ, desabafa.
MAÃSA
Outra jovem atriz que está brilhando nas novelas do SBT/Alterosa vai ganhar seu próprio livro. MaÃsa Silva, de 14 anos, ficou conhecida do grande público com suas hilárias participações quando criança no Programa Silvio Santos.
Ela também estará na Bienal Internacional do Livro de São Paulo. A obra sairá pela Editora Gutenberg, do Grupo Autêntica, mas não será uma biografia. De acordo com o selo, o livro traz muito da visão e das posições de MaÃsa, permitindo que o público a conheça a partir desses pontos de vista.
Também não vão faltar trechos com algumas experiências de sua vida. âO que o livro propõe é apresentar discussões mais aprofundadas da atriz como formadora de opinião, que atualmente se posiciona diariamente nas redes sociais. Ela cita algumas experiências vividas para debater ou levantar um assunto, mas não necessariamente conta sua vida no livroâ, esclarece a editora da Gutenberg, Silvia Masini.
Faltam livros nas escolas brasileiras
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EDUCAÃÃO EM DÃBITO
Sidineia lê para seu filho Octavio, de 7 anos. Por falta de bibliotecas na rede pública, ela se juntou a outros jovens da região onde mora em São Paulo para fundar uma biblioteca comunitária (Foto: Flávio Florido/ÃPOCA)
A lei determina que cada escola do paÃs tenha uma biblioteca. Apenas 37% delas cumprem essa exigência. São Paulo tem hoje menos bibliotecas do que tinha há quatro anos
BEATRIZ MORRONE E FLÃVIA YURI OSHIMA, na Ãpoca
O romance O menino do pijama listrado, de John Boyne, despertou a paixão de Sidineia Chagas, de 25 anos, pela leitura, quando ela cursava, em 2007, o 1º ano do ensino médio na Escola Estadual Professora Renata Menezes dos Santos. Sidineia mora em Parelheiros, região do extremo sul de São Paulo que lidera rankings de violência e de baixo desenvolvimento humano.
O encontro entre Sidineia e a história de Boyne ocorreu quando cada aluno de sua classe recebeu uma caixa com quatro livros. O mesmo encanto com os tÃtulos não aconteceu com boa parte de seus colegas. âQuando a aula acabou, muita gente rasgou os livrosâ, diz ela. Sidineia viu páginas virar dobraduras ou munição para guerra de bolinhas de papel.
A atitude dos jovens foi um reflexo do descaso com que a própria escola tratava a leitura. Sidineia afirma que as obras foram apresentadas aos alunos sem o respaldo de qualquer atividade pedagógica que destacasse a relevância delas. Além disso, a biblioteca do colégio nunca atraiu frequentadores. Quase sempre fechado, o espaço funcionava mais como um depósito de livros do que como um ambiente de incentivo ao hábito de ler. O mesmo ocorria nas demais escolas da região de Parelheiros.
Essa realidade precária inspirou Sidineia e outros 30 jovens a criar um espaço de leitura que pudessem frequentar à vontade. Nos fundos do Cemitério do Colônia, uma pequena casa antes abandonada abriga a Biblioteca Comunitária Caminhos da Leitura, fundada em 2009, em parceria com uma ONG, o Instituto Brasileiro de Estudos e Apoio Comunitário (Ibeac). âO objetivo foi criar um lugar que, além de emprestar livros, fosse um ponto de encontro para a comunidadeâ, diz Sidineia. Com a ajuda de instituições públicas e privadas, hoje a biblioteca conta com um acervo de 4 mil exemplares.

LIVROS PARA TODOS
A Biblioteca Comunitária Caminhos da Leitura, de Parelheiros. O espaço foi criado por jovens da região que sentiam falta de um espaço para ler e se reunir (Foto: Flávio Florido/ÃPOCA)
Iniciativas como a de Parelheiros surgem para tapar buracos deixados pelas polÃticas educacionais do estado. Uma lei sancionada em 2010 determina que, até 2020, todas as escolas do Brasil tenham uma biblioteca. Os números, porém, mostram que a obrigatoriedade não será cumprida dentro do prazo â se é que ela será cumprida algum dia. O Censo Escolar de 2015 mostra que somente 37% das escolas públicas e privadas de educação básica (entre a educação infantil e o fim do ensino médio) têm biblioteca. Para que a meta seja alcançada, 84 bibliotecas teriam de ser abertas diariamente, a partir desta semana e pelos próximos 1.389 dias.
Esses números mostram apenas um dos aspectos de como o incentivo à leitura é negligenciado na educação brasileira. As poucas bibliotecas existentes na rede pública costumam funcionar de forma muito deficiente. Entre 11 escolas escolhidas aleatoriamente na cidade de São Paulo, apenas duas bibliotecas funcionam em perÃodo integral e três ficam abertas eventualmente. Em seis escolas, alunos não têm livre acesso ao espaço onde ficam os livros. âA sala fica fechada. Os estudantes só podem entrar quando acompanhados por um professorâ, afirma o funcionário de uma das escolas, que não quis ser identificado. O motivo mais comum ao acesso restrito é a falta de um supervisor no local.
Isso não ocorreria se a lei fosse respeitada. As bibliotecas escolares devem contar com a presença de um bibliotecário preparado para organizar, abastecer e gerenciar o acervo. Na contramão do que diz a lei, a rede estadual de ensino de São Paulo passou a substituir, em 2009, a instalação de bibliotecas por salas de leitura. Diferentemente das bibliotecas, essas salas são espaços informais, com acervo diminuto, sem preocupação com iluminação ou organização apropriada para atividades relacionadas ao estudo e à leitura. Outra diferença fundamental da sala de leitura é que ela dispensa a presença de um profissional preparado para receber os alunos. âUm dos papéis do bibliotecário é sugerir ações pedagógicas que tornem a biblioteca um espaço convidativo para os alunosâ, diz Maria Aparecida Lamas, educadora especializada em formação de leitores.
Em 2012, 13% das escolas estaduais paulistas tinham bibliotecas. Salas de leitura estavam presentes em 75,4% delas. Em 2015, o número de escolas com bibliotecas caiu para 7,4%, enquanto o de salas de leitura aumentou para 78%. Nesse mesmo perÃodo, não houve expansão da rede de bibliotecas entre as escolas municipais.
Educadores ouvidos por ÃPOCA afirmam que São Paulo freou a implantação de bibliotecas para economizar dinheiro, tese endossada pelo sindicato dos bibliotecários. âO governo usa a máscara da sala de leitura para extinguir o cargo de bibliotecário em suas escolasâ, diz Vera Stefanov, presidente do Sindicato dos Bibliotecários de São Paulo. Questionado, o governo paulista só mencionou a expansão de salas de leitura. São Paulo é o quarto estado com o pior Ãndice de bibliotecas escolares, seguido por Acre (19,3%), Pará (18%) e Maranhão (15%). (Confira o gráfico abaixo.)
A lei que torna obrigatória a existência de bibliotecas baseia-se em evidências pedagógicas e cientÃficas sobre os benefÃcios da leitura para o cérebro da criança e seu desenvolvimento â como estudante e como cidadão. Um estudo da Universidade York, do Canadá, constatou que crianças expostas a livros têm mais facilidade em lidar com opiniões e sentimentos alheios. Quando mediada por familiares, aponta pesquisa da Faculdade de Medicina de Nova York, a leitura contribui para estreitar vÃnculos afetivos e estimular o diálogo. Entre seus benefÃcios, destacam-se também a expansão do vocabulário e o desenvolvimento da memória. A exposição constante à literatura é a forma mais eficiente para combater o analfabetismo funcional, do qual 27% da população brasileira padece. âA dificuldade em interpretar o que leem ocorre basicamente porque as pessoas ainda não automatizaram a decodificação das palavras. Isso ocorre somente com o hábito da leituraâ, disse a ÃPOCA Stanislas Dehaene, neurocientista francês que pesquisa distorções cognitivas no aprendizado.
Bibliotecas são espaços férteis para atividades que estimulam a leitura, a narração de histórias e a criatividade. Sidineia e seus colegas da biblioteca já se acostumaram a tirar as histórias das prateleiras e transformá-las numa infinidade de atividades que envolvem toda a comunidade. Poemas de Drummond embalam melodias de baião. Versos de Manoel de Barros inspiram encenações teatrais. Textos de Simone de Beauvoir iniciam discussões sobre violência contra a mulher. âA vizinhança se envolve em discussões sobre polÃtica e direitos humanosâ, diz Sidineia. Em cinco anos, o PÃlulas de Leitura, projeto dessa biblioteca, alcançou 12 mil crianças de Parelheiros. Em um paÃs com 13 milhões de analfabetos, iniciativas como essas são a melhor resposta da população para um exemplo de descaso do poder público com a educação brasileira.